Santa Maria ibn Harun - o blog da Cidade de Faro

segunda-feira, janeiro 31, 2005

Brites de Almeida: Uma farense para a história...

Na História de Portugal estão vários nomes femininos que, de uma forma ou de outra, deram um importante contributo na formação do nosso país. De entre os mais marcantes e inspiradores, Brites de Almeida é, certamente, um deles.

O nome, à primeira vista, pode não parecer muito familiar, mas Brites de Almeida é nada mais, nada menos, que a conhecidíssima Padeira de Aljubarrota!

Dividem-se as opiniões no que toca à existência desta personagem- uns acreditam ser apenas um mito inspirado no sentimento de resistência e combate ás invasões castelhanas, outros defendem que a Padeira de Aljubarrota era uma figura femenina que existiu na realidade e que se destacou para sempre na História Nacional pela sua bravura- mas independentemente destas, sabe-se que existiu realmente em Aljubarrota, na época da batalha com o mesmo nome, uma padeira chamada Brites de Almeida. Inclusive, as ruínas da sua casa encontram-se em Alcobaça numa praça com o seu nome e onde também está erguida uma estátua em sua homenagem.

E perguntarão certamente: porquê falar na Padeira de Aljubarrota, num blogue sobre a cidade de Faro? O que tem a Padeira de Aljubarrota a ver com Faro?

Pode parecer estranho à partida, mas acreditem que não se trata de um absurdo, ou de uma qualquer descoordenação de temas. Não. É que Brites de Almeida, dada como a famosa "Padeira de Aljubarrota" que marcou a História, é farense de nascença. É um facto ainda pouco, ou talvez nada divulgado, e por isso, desconhecido para a maioria das gentes da nossa terra, e para o resto dos portugueses em geral.

E para não se ferirem susceptibilidades sobre este assunto, convém ficarem a conhecer a história desta personagem:
Brites de Almeida nasceu em meados do século XVI, em Faro, tinha a nossa cidade na altura, a designação de Santa Maria de Faaron. Era originária de uma família muito humilde, e é geralmente descrita como sendo, já em pequena, uma criança alta, forte e musculada meio "Maria-rapaz" que gostava de se envolver em brigas. Quando tinha 20 anos, os pais morreram e ela usou o pouco dinheiro que eles lhe deixaram para aprender a manejar a espada, algo que só os homens nobres faziam naquele tempo. Então para ganhar dinheiro, Brites entrou em feiras para lutar com homens. Certo dia, um soldado desafiou Brites: se o soldado ganhasse, Brites casaria com ele, se ele perdesse, Brites mata-lo ia. E Brites acabou por vencê-lo...

Mas naquela época, matar um soldado era crime e para fugir à justiça, Brites roubou um bote com o intuito de fugir para Castela, mas um grupo de piratas raptou-a e vendeu-a como escrava. Como era uma verdadeira "mulher coragem", passado um ano Brites consegue fugir para Portugal com mais dois outros escravos portugueses. Algumas versões referem ainda que a embarcação onde Brites se deslocava foi apanhada por uma tempestade e foi parar à praia da Ericeira. Como ainda era procurada pela justiça, Brites cortou os cabelos, disfarçou-se de homem e tornou-se almocreve. Mesmo assim, ainda teve alguns sarilhos, então Brites, já vestida de mulher, apanhou um barco para Valada acabando por ir parar a Aljubarrota.

Já cansada e sem forma de ganhar dinheiro, começou a pedir esmola à porta de um forno. A padeira, que era já idosa, ao olhar para Brites reparou na sua forte constituição e viu que era a pessoa ideal para a ajudar e para continuar o negócio.

Mais tarde, em 1385 deu-se a conhecida batalha. Como a maioria dos portugueses, Brites estava ao lado de D. João, Mestre de Avis e não queria os espanhóis a governar Portugal. Depois de Nuno Álvares Pereira vencer os espanhóis na batalha, Brites liderou o grupo de populares que perseguiu os espanhóis em fuga. Quando regressa a casa, no dia 14 de Agosto do mesmo ano, a padeira encontrou escondidos no forno do pão, sete castelhanos. Á medida que eles iam saíndo do forno, a padeira matava-os à pazada. Existem várias versões, uma refere que Brites cozeu os castelhanos vivos dentro do forno, outras aumentam o número de castelhanos.

A história conta ainda que, quando Brites fez quarenta anos se casou com um lavrador rico que admirava e que chegou a ter filhos.
São várias versões desta lenda, mas é natural que ao longo do tempo, se tenham alterado e acrescentado outros pormenores à história. Porém, sejam alguns factos verídicos ou não, Brites de Almeida é realmente um exemplo da coragem e da bravura lusitana. Mais uma farense que engrandeceu a História do nosso país.

E embora os maiores feitos e proezas de Brites de Almeida, não se tenham destacado necessariamente em Faro e no Algarve, deveriam ser maiores as referências sobre esta figura histórica ser farense. Os farenses e os algarvios têm o direito de saber, que na batalha de Aljubarrota, esteve também na luta uma conterrânea sua, que também pela valentia com que fez frente aos castelhanos, se tornou para sempre, num dos grandes mitos da História de Portugal.

Um dos seus grandes mitos femininos. Mais uma grande mulher farense...

sexta-feira, janeiro 14, 2005

Teatro Lethes


Lethes (designação de um mítico rio, cujas águas tinham o poder mágico de apagar da lembrança das almas os reveses e as agruras da vida).

O edifício que hoje se designa por Teatro Lethes começou por ser um colégio de Jesuítas - Colégio de Santiago Maior, fundado pelo então Bispo do Algarve D. Fernando Martins Mascarenhas, «para ali ensinarem as letras, cuja licença lhes foi concedida por Carta d´El Rei D. Filippe datada em Madrid a 8 de Fevereiro de 1599,...».
Em 1759, confiscados os bens e banida do país e dos domínios ultramarinos aCompanhia de Jesus, o Colégio de Santiago Maior encerrou as suas portas. Com a ocupação das tropas napoleónicas comandadas pelo General Junot, as instalações do antigo Colégio foram devassadas e profanadas para aí alojarem os seus soldados.

Anos mais tarde, em 1843, foi o Colégio arrematado em hasta pública pelo Dr.Lázaro Doglioni, médico italiano, de grande sensibilidade artística, que manifestara publicamente a sua intenção de construir em Faro um teatro à semelhança do S. Carlos de Lisboa. As obras de restauro e adaptação da antiga igreja a teatro prolongaram-se até à primavera de 1845. No lugar do altar-mor ficava a "Sala Verde" do teatro e no coro da Igreja que se situava junto à frontaria, erigiu-se o respectivo palco. A sala do teatro Lethes possuía apenas a plateia e duas galerias de camarotes. A inauguração do teatro efectuou-se a 4 de Abril de 1845, associando-se às comemorações do aniversário da Rainha D. Maria II.

Após a morte de Dr. Lázaro Doglioni os seus bens foram legados ao sobrinho Dr. Justino Cúmano, notável clínico, grande benemérito e protector das artes. A ele se ficou a dever a fama que o Teatro Lethes granjeou, não só no Algarve como em todo o país. Na década de 1860 ampliou as capacidades do teatro para 621 espectadores. Mandou construir uma caixa de ressonância abobadada, ampliou a plateia para 215 espectadores, aumentou de duas para quatro ordens de camarotes repartidas por 51 compartimentos com seis lugares cada e uma varanda com capacidade para 100 pessoas. Para o bom funcionamento do teatro constituiu-se uma autêntica equipa, na qual se incluía a orquestra e vários outros elementos ligados aos bastidores do espaço cénico.

A 11 de Setembro de 1898 exibia-se pela primeira vez em Faro o chamado animatógrafo, tendo-se então instalado no Teatro Lethes por ser o mais amplo e distinto espaço cultural da cidade. Em 1901 a sala foi encerrada e em 1906 iniciam-se obras de restauro, sob a orientação de João Coelho Pereira Matos e do pintor José Filipe Porfírio, concluindo-se os trabalhos a 21 de Abril de 1908. O teatro reabriu, possuindo uma acústica perfeita, confortável plateia, quatro ordens de camarotes, com varandins de ferro forjado, tectos pintados representando cenas de música e um pano de boca com magnífica paisagem bucólica, tudo da autoria de José Filipe Porfírio. A iluminação passou a ser feita por um sistema especial em acetileno.

O declínio dos espectáculos e consequentemente da sala começa em 1920, encerrando-se o teatro em 1925. Em 1951 a família Cúmano vendeu o imóvel à Cruz Vermelha Portuguesa, em cuja posse ainda se mantém. De 1972 a 1993 na Ala Sul do edifício funcionou a escola de música da Associação do Conservatório Regional do Algarve (Boletim Informativo "O Teatro Amador no Algarve" editado pela Delegação Regional do Sul da S.E.C. em 1987 - O TEATRO LETHES - Breve apontamento histórico por José Carlos Vilhena Mesquita).

A sala do Teatro Lethes encontra-se cedida por protocolo à Delegação Regional do Algarve do Ministério da Cultura e na Ala Norte restaurada e adaptada em 1991 funcionam os serviços regionais do Ministério da Cultura. Nos anos de 1990 a 1993, a Delegação Regional da Cultura equipou a sala de espectáculos com um sistema de refrigeração e substituiu algum equipamento de palco e procedeu à substituição dos tecidos e alcatifas, bem como ao restauro das madeiras e ferragens.

O teatro esteve até final de 1998 com uma programação regular. Detectada a necessidade de se proceder a uma consolidação estrutural em abóbadas de cobertura e paredes, no final desse ano, a Delegação Regional decidiu encerrar a sala de espectáculo. Em Março de 1999 iniciaram-se os trabalhos de diagnóstico de "patologias" do edifício, cujos relatórios especializados possibilitaram a realização das obras de consolidação e restauro, concluídas em Maio de 2001.